Deuteronômio: a vida em primeiro lugar

Com o lema “Abre tua mão para o teu irmão” (Dt 15,11), o Mês da Bíblia 2020 fundamenta este ano os estudos do livro do Deuteronômio. Setembro é referência para o estudo e a contemplação da Palavra de Deus em todo o Brasil desde 1971.
O Deuteronômio é rico em reflexões morais e éticas, com leis para regular as relações com Deus e com o próximo. Destaca-se a preocupação em promover a justiça, a solidariedade com os pobres, o órfão, a viúva e o estrangeiro. São leis humanitárias encontradas também no Código da Aliança (Ex 20-23). O livro é o último escrito do Pentateuco ou Torá. Deuteronômio é uma palavra grega que significa segunda lei (2Rs 22,8s).
O lema “Abre a tua mão para teu irmão” (Dt 15,11) sublinha a necessidade da justiça social na comunidade de Israel, na qual não pode e não deve haver pobres, o que vale também para nossa realidade atual. Portanto, existe a necessidade de uma organização, de maneira que todos possam ser favorecidos e acolhidos na partilha. Os pobres sempre vão existir, mas “no meio de vocês não deve haver nenhum pobre” (Dt 15,4-8).
A ideia central de todo o livro é que o povo de Israel possa viver feliz e próspero se for fiel à aliança com Deus; se for infiel, terá a desgraça e acabará perdendo a Terra. O livro, após relembrar o Decálogo (Dt 5,1-22), mostra que o comportamento do homem para com Deus é o amor com todo o ser (Dt 6,4-9). Apresenta uma longa catequese, explicando o significado do amor nas circunstâncias da vida pessoal, social, política e religiosa. A catequese é apresentada através das leis do Deuteronômio (Dt. 12-26), onde se procura ensinar ao homem como viver sua relação com Deus, com as autoridades, com o outro e com os seres da natureza.
O Deuteronômio é um texto complexo, fruto de um longo processo redacional com contradições e diversas imagens de Deus (Dt 10,18-19; 2, 33-34). Apesar de ser atribuído a Moisés, não é ele o autor. Na verdade, não há uma autoria certa mas trata-se dos escritos e pregações da escola dos levitas. Portanto, o livro foi escrito em mutirão, durante muito tempo, – aproximadamente ao longo de quatrocentos anos -, com a finalidade de preservar e manter viva a libertação do povo de Israel.
Narra os fatos que vão desde a conclusão da Aliança até a entrada na terra prometida, entre os anos de 1250 e 1220 a.C.. Porém, não é um relato histórico, mas uma forma de três grandes discursos de Moisés. Os discursos refletem não tanto os problemas do povo na saída do Egito e na travessia no deserto, mas as dificuldades e crises na queda de Samaria (722 a. C.), até o exílio da Babilônia (586 a. C.). Enfim, o Deuteronômio é o livro da Aliança que apresenta o Amor de Deus, que se expressa através da lei como identidade da terra, como herança recebida de Deus.
O tema central é a Aliança entre Deus e o povo. Logo os textos não oferecem nenhuma organização sobre a religião, embora seja uma coletânea de pregações dos levitas. O livro apresenta o Senhor Deus como único Deus verdadeiro (Dt 6, 4), o que implica a rejeição total à idolatria e qualquer representação de Deus (Dt 4, 1-40). Quer transmitir os critérios e fundamentos para viver na terra dada por Deus ao povo. O essencial da fé não é a posse da terra, nem a liderança de Moisés, mas a fidelidade divina às promessas feitas aos patriarcas. Porém, o povo sempre é convocado a construir uma sociedade justa e fraterna, eliminando as estruturas injustas que oprimiam os pobres. Deus é chamado Pai (Dt. 1,31), e os membros do povo são chamados entre si irmãos. A vocação do povo de Deus é a fraternidade e a partilha.
Viver na Aliança não significa apenas obedecer uma lista de leis antigas, mas viver de acordo com o temor e amor de Deus. Portanto, ao falar das normas ou mandamentos se referem às Leis deuteronomicas (Dt 12-16). A relação com Deus é alicerce das relações com o próximo e com a natureza. Como os profetas, eles criticam as instituições e as relações sociais corrompidas e anunciam o caminho para a conversão, a fim de viver a fidelidade para com Deus através da Aliança.
Resumindo, o livro revela vários temas: o verdadeiro Deus é aquele que libertou o povo e lhe dá vida. Deus prefere a misericórdia e a justiça aos cultos sagrados de purificação e sacrifício. O ser humano se realiza na comunidade por meio de uma sociedade solidária e fraterna.

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